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Crônicas

24/02/2022

A nossa vida real

Passavam alguns minutos das 6h e meu celular tocou incessantemente me lembrando que tinha mais um dia me esperando lá fora. Me sentia cansado, apesar das quase sete horas de sono. Não tinha motivação para sair da cama, e ali fiquei por mais um tempo. Sem fazer coisa alguma, apenas com um dos olhos abertos em redes sociais que me diziam nada de útil. Já atrasado, levantei sem qualquer ânimo para encarar a manhã.

Não há um motivo em específico. O contrário deveria acontecer. A vida não vai mal, o emprego é bom. E há muito eu não sentia tanta satisfação com o que faço. Mas aqui dentro não está tudo bem. Está confuso, arrastado, como um céu meio nublado, que não deixa a penumbra dispersar, e a luz adia chegada. O banho demorado serviu para adiar a obrigação de encarar o que vem pela frente. Principalmente, a inevitabilidade de ver pessoas, responder bons-dias, interagir querendo calar. Fingir tranquilidade, e que o sorriso no rosto não é mera maquiagem para evitar explicações a quem nem se importaria se começássemos a dividir tanta angústia.

E de onde sairiam palavras para explicar o que sequer conseguimos colocar em pensamentos ordenadamente? O caos é só nosso, e mal nos entendemos com ele, quem dirá estranhos aos medos e às incertezas que moram sem pagar aluguel na pensão que mantemos aberta para cada um deles, como uma mãe coruja que não deixa os filhos viverem longe da saia.

Mas fui para a rua, para o que me esperava depois da mesma cama que já me arrependo de ter deixado para trás. Faço isso porque sei que não sou o único. A primeira pessoa que passou por mim fora do prédio pode estar passando exatamente pela mesma coisa. O motorista lerdo para quem eu buzinei por demorar a ver o sinal verde estava apenas absorto no problemão que ainda não descobriu como resolver. A mulher que me cumprimentou na chegada do trabalho, quem sabe, enfrenta o maior dilema da vida, e só queria que eu, ou qualquer um que vai entrar ali hoje, apontasse um caminho para ela escolher, porque sozinha não parece conseguir.

E assim eu sei que vou passar mais um dia. Sem ser o mais feliz de todos, pensando se meu destino poderia ser diferente. Mas seguindo, porque também sei que o que não me faltam são motivos para isso. Amanhã vou acordar melhor. Se não for amanhã, será depois. Estamos todos sujeitos aos caprichos das nossas angústias. O que nos resta é aprender a viver com elas, e tratar os outros bem. Nunca se sabe o tamanho da dor que podem estar vivendo.

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